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Homenagem a Cleodon Silva

09/06/2011

Cleodon Silva partiu, quem sabe? para algum lugar misterioso, além da memória, do significado das realizações, das lembranças de ações e dos conflitos. Mas agora, está aqui, vivo em nosso sentimento de perda . Silva, como era chamado na década de 70, naqueles anos de chumbo, temido dirigente sindical, atuava na clandestinidade, organizava comissões de fábrica, comandos de luta dos metalúrgicos, para enfrentar os patrões e a ditadura militar.

Naquele momento a resistência nas fábricas era miúda, acontecia quase “bocalmente” como falavam os operários, único caminho para a organização frente a uma ditadura ainda consolidada no poder. Depois vieram, nos anos 78, 79, manifestações amplas e abertas de milhares de operários reunidos na Rua Carmo, sede do Sindicato e em todas as regiões da cidade. Estivemos juntos na morte de Santo Dias, na ocupação da Zona Sul pela policia militar na greve de 79 , no jornal Luta Sindical do qual eu participava como jornalista e assessor . Na organização dos operários Silva era um espécie de comandante militar, com suas estratégias precisas e aguçadas, também um sonhador que via a mudança do regime logo ali; era também um boa praça que bebia pinga no bar com os peões e traçava aquelas coxinhas espantosamente gordurosas e as comidas enfumaçadas do Largo de Socorro. Ah, era um cara doce e sensível, que ria alto e contava histórias de Pernambuco e outros arredores.

Silva não era um orador brilhante como Stanislau, o Stan; não tinha a disciplina e o espirito de solidariedade de Nadine Habert, o carisma de Valdemar Rossi, ou a objetividade e o humor sério de Franco Farinazzo; não tinha a dragoniana defesa de posições de Hélio Bombardi ou a compaixão de Santo Dias; tampouco a alegria apaixonada de Vito Gianotti. Silva reunia muitas dessas virtudes e desvirtudes e articulava primorosamente as redes, pensava nos desdobramento futuros, amava a politica e todas as suas possibilidades libertárias. Um intelectual sonhador e inteligente. Era um tempo onde as pessoas que lutavam lado a lado ainda desconheciam o sombrio da politica de morcegos, que morde e assopra, ou a que mata e canta as virtudes do morto. Silva trazia também consigo a poesia de Pedro Macambira que circulava no mundo operário dos bairros e nas fábricas, poesia dos esquecidos, dos vencidos, dos resistentes que não tinham caminho senão lutar ou morrer. Macambira estava presente nos bairros, nas fábricas, na “rádio peão”, denunciando o chefete cruel e dedo-duro, os crimes do regime militar, o lider sindical sem principios que amaciava o arrocho dos ditadores.
A ele nossa homenagem, a minha mais sincera, pois Cleodon Silva incorpora uma plêiade de jovens brilhantes que se organizaram em torno da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo para resistir e dizer que estávamos vivos, e queríamos um outro mundo impossível. Se hoje colhemos alguns frutos no quintal da democracia e da vida devemos muito a todos esses desbravadores que trazem na alma um Brasil mais humano.

Hamilton Faria é poeta e coordenador da Área de Desenvolvimento Cultural do Instituto Pólis.

Cleodon Silva foi militante organizador da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo nos anos 70. Nos anos 80 contribuiu para a organização da Central Única dos Trabalhadores, CUT e para a organização de movimentos sociais, de jovens, mulheres, sindicais etc. Fundou o Instituto Lidas, organização que trabalha com geoprocessamento e mapeamento de territórios e era membro da diretoria da Casa dos Meninos.