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Organizações sociais discutem saúde, gênero e racismo

20/10/2017

Durante um dia inteiro, pesquisadoras, estudantes, ativistas do movimento negro, feminista e das causas juvenis de quatro estados brasileiros conversaram, debateram e construíram horizontes comuns acerca de práticas e políticas de saúde dirigidas às mulheres jovens negras. Como premissa, a realidade expressa em números e em testemunhos pessoais de que a cor da pele, o gênero e a idade influem no modo concreto pelo qual as pessoas acessam seus direitos. Promovido pela parceria entre a Agenda Jovem Fiocruz e o Hub das Pretas, o primeiro encontro temático Saúde, racismo e gênero: Mulheres jovens presentes! tomou lugar na Tenda da Ciência, no campus Fiocruz Manguinhos (6/10).

O encontro faz parte de uma série de eventos previstos e organizados pela Agenda Jovem Fiocruz – instância de construção coletiva na Fiocruz para ações, pesquisas, serviços e intervenções que fortaleçam a interação entre o campo da saúde e o campo das políticas públicas de juventude.

Neste dia, estavam reunidos coletivos de jovens mulheres negras (Hub das Pretas) dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Distrito Federal, representações do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), das ONG’s Criola e Fase, e Oxfam Brasil. Os institutos de Estudos Socioeconômicos (Inesc), de Brasília, Instituto Pólis, e a organização Ação Educativa, de São Paulo, estavam entre os apoiadores.

Durante a manhã, houve apresentações culturais temáticas, a exibição do documentário É isso aí,  sobre o Estatuto da Juventude, e representantes das organizações deram as boas vindas ao público presente. Alunos das escolas da rede pública de ensino de Manguinhos e Maré estavam entre os convidados, além de trabalhadores da Fiocruz vinculados ao tema.

Promoção da saúde
Rachel Barros, da ONG Fase e Nadaby Melo, do Programa de Produção Cultural no Território de Manguinhos: olha nós aí! (Museu da Vida/Fiocruz), conduziram o cerimonial de abertura apresentando a Agenda Jovem Fiocruz e Hub das Pretas. Após a recepção calorosa das cerimonialistas, o público foi confrontado com dados que contextualizam as questões sensíveis e desafios relacionados com a preservação da vida e promoção da saúde das mulheres jovens negras.

Entre eles, a constatação de que 62,8% das vítimas de morte materna são negras, e que 65,9% das mulheres submetidas a algum tipo de violência obstétrica no Brasil são pretas ou pardas. Rachel e Nadaby também chamaram atenção para a vulnerabilidade ligada aos fatores gênero-raça-classe no tocante à infecção por arboviroses pelo Aedes aegypti e às violências. “As mulheres negras, jovens e pobres são as mais afetadas. Entre as que tiveram bebês com microcefalia e alterações neurológicas até fevereiro de 2016, 71,3% tinham de 15 a 29 anos [consideradas jovens pelo Estatuto]”, informou Nadaby.

“As mulheres negras são mais propensas a serem vítimas de violência, representando 64% das vítimas de assassinatos no Brasil; 56,8% das vítimas de estupros registrados no Estado do Rio de Janeiro em 2014 eram negras”, completou Rachel. A rapper Helen N’zinga, estudante de ciências sociais, e mobilizadora do projeto Hub das Pretas pelo Ibase apresentou o rap Meu desabafo na abertura do evento. A artista narrou, em versos rimados, as angústias vividas por moradores de territórios militarizados, marcados por vulnerabilidades civis e socioambientais, dificuldades de acesso ao mercado formal de trabalho, renda, e à saúde.

Direitos e cidadania
Representando a Presidência da Fiocruz, Juliano Lima, da Coordenação-Geral de Gestão de Pessoas (Cogepe/Fiocruz), informou que a presidente da instituição, Nísia Trindade, ficou impossibilitada de comparecer por outros compromissos, mas saudou a articulação entre academia e a sociedade civil que deu forma ao evento.

Juliano destacou que a Fiocruz é uma instituição comprometida com uma perspectiva de produção científica que envolve a sociedade brasileira em seu fazer, dialogando com movimentos sociais para tanto. E reafirmou o compromisso da Fiocruz de manter vivo o legado de Oswaldo Cruz, a partir de um modelo e visão de sociedade mais justa, mais igualitária, com mais direitos e mais cidadania. Juliano também informou que a Presidência da Fiocruz têm intensificado a agenda relacionada à equidade de gênero e raça na instituição.

Rita Brandão, diretora do Ibase, falou sobre o projeto Jovens mulheres negras fortalecidas na luta contra o racismo e sexismo, desenvolvido pelo Instituto em parceria com a Oxfam Brasil. Destacou que o Ibase, em sua nova gestão, vem colocando as questões de gênero e raça como eixos estratégicos e estruturantes de seu planejamento.

Tauá Lourenço, assessora política da Oxfam Brasil e coordenadora nacional do projeto do Hub das Pretas, declarou que a proposta ao longo do dia seria a de que se pensasse como os atores sociais (institucionalizados ou não) poderiam renovar suas formas de fazer incidência nas políticas públicas.

Lucia Xavier, coordenadora geral da ONG Criola, valorizou a saúde como um bem que se precisa cuidar e proteger, e inquiriu o público a respeito dos dados trazidos pelas cerimonialistas: “Por que as mulheres negras estão morrendo mais?”, provocou. Ao final da manhã, Lucia conduziu uma dinâmica com o público a partir da pergunta “o que é saúde para você?”. O questionamento sobre um modelo de atendimento e promoção da saúde estritamente biomédico, verticalizado (sem participação popular) esteve presente em algumas falas. A questão da saúde mental da mulher negra, as violências, discriminação por identidade de gênero e o racismo institucional foram outros temas fortes durante a troca de opiniões.

Regina Novaes, antropóloga e primeira presidente do Conselho Nacional de Juventude, fez uma exposição sobre a condição juvenil dos anos 80 à atualidade do Estatuto da Juventude no Brasil e sobre como o conceito mutável de ser jovem influenciou as políticas para o segmento de lá para cá. Entre os tópicos levantados, destacou o momento atual como tempo de intensificação dos controles, metas e exigências, em especial no mundo do trabalho. “Isso tem provocado o que chamo de “medo de sobrar”. Atinge toda uma geração, com diferentes níveis educacionais”, comentou.

Ao longo do dia, os debates foram registrados em um painel de “grafismo”, onde as ideias principais foram representadas por meio de desenhos e formas gráficas e o resultado foi exibido ao final do evento. Uma linha do tempo com marcos históricos da saúde pública mundial foi disponibilizada para que o público afixasse no mural os marcos pessoais relativos à saúde da sua história.

Saiba mais.

Oficinas temáticas debatem as demandas das mulheres negras

Fonte : Portal Fio Cruz

 

Conheça as leis para promoção da igualdade étnico-racial

A Lei Caó, n° 7.716/89  torna crime o racismo;

Lei 12.288/2010 cria o Estatuto da Igualdade Racial;

Lei 11.645/2008 e Lei 10.639/03  incluem o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena nas escolas

Lei 12.711 determina as cotas sociais e raciais nas universidades,

Lei 12.990/14 reserva aos negros  e negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos

 

Confira também:

Publicação: Gênero e Raça nas Políticas Públicas

Programa Jovem Monitor Cultural: Culturas Negras

Saúde das mulheres negras e perfil da juventude brasileira -Programa Jovem Monitor Cultural – PJMC

Genocídio da juventude negra e racismo – Programa Jovem Monitor Cultural – PJMC

JUVENTUDE – I Encontro Nacional do Projeto Jovens Mulheres Negras acontece em Brasília