Patrimônio, Memória e Diversidade

Patrimônio, Memória e Diversidade
Estátuas Ilustrando Patrimônio, Memória e Diversidade

Patrimônio,
Memória &
Diversidade

Um olhar
antirracista sobre
os monumentos
da cidade de
São Paulo.

Que histórias as
cidades nos contam?

O debate sobre a representatividade das diversidades sociais no espaço público – o que inclui sua produção intelectual artística, cultural, religiosa, ancestral – é fundamental para entendermos que as vivências de grupos historicamente subalternizados são relevantes para o espaço urbano. Enunciar, valorizar e proteger sua memória é um dos elementos constitutivos para o exercício do direito à cidade. Para pensar e construir cidades justas, educadoras, antirracistas e sem discriminação, propomos uma pergunta como ponto de partida: que histórias as cidades nos contam? A seguir, abordamos o conjunto de monumentos oficiais do Município de São Paulo para tentar lançar respostas e provocações a partir dessa pergunta.

Em 2020, desenvolvemos a pesquisa Presença Negra nos Espaços Públicos para contribuir com as discussões dos Projetos de Lei (PL) os quais defendem a substituição, retirada ou contextualização de monumentos que evocavam a glória dos períodos de exploração e opressão de pessoas não brancas. No ano seguinte, a intervenção que ateou fogo ao Borba Gato (São Paulo – SP), feita pelo coletivo Revolução Periférica, deu novos contornos ao debate público sobre homenagens a figuras controversas e a representatividade dos monumentos. É neste contexto que este estudo se insere.

 

Desde sua constituição em 1987, o Pólis assumiu o compromisso ético e político de lutar para garantir a possibilidade radical de atores sociais diversos participarem dos processos de transformação das cidades. Acreditamos que a cidade deve construir, em igualdade, referências identitárias individuais e coletivas aos grupos que a compõem para que as relações hierárquicas e de dominação sejam subvertidas e não se perpetuem. Para tanto, defendemos o que é comumente tido como utopia: o direito à cidade. Um direito humano coletivo, de todas as pessoas – das presentes e futuras gerações -, de habitar, usar, ocupar, produzir, governar e desfrutar de forma equitativa de cidades justas, inclusivas, seguras, democráticas e ambientalmente responsáveis.

 

Esta pesquisa tem como foco o Município de São Paulo e é parte integrante do projeto “Patrimônio, Memória & Diversidade: um Olhar Antirracista sobre Monumentos da Cidade de SP”, subsidiado através de emenda parlamentar da Mandata Quilombo, da Deputada Estadual Erica Malunguinho (empenhada em 2022/2023). O convênio é firmado junto à Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo.

 

[para saber mais, clique aqui e veja o estudo completo]

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Quem os
monumentos da
cidade retratam?

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Dos 377 monumentos da cidade de São Paulo, 53 são símbolos (14%), 50 são objetos (13%), 26 representam figuras religiosas e mitológicas (7%), 16 são datas comemorativas (4%), 9 são de outros tipos de figuras (2%), 13 não foram identificados (3%) e 210 (56%) são monumentos a pessoas.

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Para cada monumento que homenageia pessoas negras, existem 13,4 monumentos a pessoas brancas

Pessoas negras, indígenas e mulheres estão sub-representadas. Das 210 obras, 155 representam pessoas brancas (74%), 12 são negras (5,5%), 12 são asiáticas (5,5%), 4 são indígenas (2%) e 9 retratam várias raças (4%). 18 não tiveram a raça/cor identificada (9%).

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Para cada monumento que homenageia pessoas indígenas, existem 40 monumentos a pessoas brancas

Para cada monumento que retrata uma figura indígena, existem 40 que representam pessoas brancas. Nenhuma obra que retrata pessoas indígenas corresponde a pessoas reais: todas retratam personagens genéricas ou fictícias que reiteram estereótipos racistas reproduzidos pela branquitude.

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Para cada monumento que homenageia mulheres, existem 8,7 monumentos que retratam homens

A diferença mais gritante está na comparação por gênero: monumentos a homens correspondem a 83% do total, enquanto mulheres são homenageadas por 9% das obras (os dois gêneros estão presentes em 8%).

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A população preta e parda da cidade de São Paulo representa cerca de 37% do total, mas os monumentos que homenageiam pessoas negras correspondem a apenas 5,5% das obras que representam figuras humanas. A população branca, que é 60% da população paulistana, se vê em 74% dos monumentos.

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As homenagens a mulheres, além de menos numerosas, são mais genéricas do que as dedicadas aos homens. Das 20 obras, apenas 10 homenageiam nominalmente mulheres, o que corresponde a 50% das obras erguidas a figuras femininas. Essa proporção, no entanto, é significativamente maior entre homens: dos 174 monumentos que retratam figuras masculinas, 145 se dedicam nominalmente (83%)

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A desproporcionalidade também é observada nas autorias dos monumentos: cerca de 65% das obras foram concebidas por artistas homens e somente 9,5% por artistas mulheres.

O restante não teve a autoria identificada, mas mesmo que fossem todas femininas (uma suposição pouco provável), a desigualdade de gênero se manteria, pois a grande maioria das obras ainda seria criação de artistas homens. A participação limitada de artistas mulheres é ainda pior dentre aqueles monumentos que, justamente, homenageiam figuras femininas: do total de 20 obras, 16 foram feitas por artistas masculinos (80%).

A mesma incongruência é vista nas obras que retratam pessoas não brancas: homens brancos assinam a autoria dos 4 monumentos a indígenas e de 5 monumentos que representam pessoas negras (do total de 12).

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Monumentos
Controversos

Há um número expressivo de obras que homenageiam figuras controversas: 48 monumentos (23%) são dedicados a personagens históricos cuja imagem enaltece memórias opressoras, exaltam episódios violentos e de extermínio de povos não brancos. Monumentos a Anhanguera, Anchieta, Duque de Caxias ou Borba Gato, por exemplo, continuam perpetuando imagens e valores construídos por grupos dominantes que fortalecem o apagamento sistemático de outras narrativas históricas.

 

Os monumentos controversos têm raça e gênero. Nenhuma representação presta homenagens a figuras femininas, enquanto 42 são dedicadas a homens (87%), quase todos brancos. O restante (13%) mistura figuras femininas e masculinas na mesma obra. Por um lado, os monumentos fazem parecer, erroneamente, que as mulheres não têm seu lugar na memória apagando-as da história contada por obras urbanas. Por outro, eles demonstram que a participação de homens em eventos históricos – supostamente definidores da nossa identidade – pode ser, no mínimo, controversa.

As controvérsias estão intimamente ligadas às relações de poder de domínio branco e patriarcal, mas também estão relacionadas à nossa incapacidade de rever e repensar a forma como construímos nossas identidades, como contamos nossas histórias, como reproduzimos narrativas hegemônicas e como produzimos e preservamos nossa memória, a qual continua exaltando homens brancos, mesmo quando sua biografia é definida por contradições e violências.

Onde estão
os Monumentos?

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Cerca de 51% da população da capital paulista mora em distritos que possuem, ao menos, um monumento, mas somente 33% vivem onde há algum monumento retratando pessoas.

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Os monumentos apresentam um padrão territorial de forte concentração: na região central (distritos Sé e República) e na região do Parque Ibirapuera (distrito de Moema) – o que poderia ser considerado uma restrição do acesso a tais elementos da memória. Além de indicar a ausência de monumentos na maior parte da cidade, tal concentração também sugere que outros elementos artístico-paisagísticos que atuam na construção de memórias coletivas e narrativas históricas não são reconhecidos pelo poder público.

É questionável que a única região, fora do centro, a concentrar espacialmente um conjunto significativo de monumentos seja local de moradia da elite econômica. A concentração de obras nessas áreas não é fruto do acaso ou do descuido: é um projeto político que só concede o direito à memória para a elite branca da cidade, concentrando estátuas em seus territórios de privilégios.

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Mesmo que a região central seja local de trabalho de milhões de pessoas e que concentre as principais conexões das infraestruturas de transporte da metrópole, é questionável que não haja tantos monumentos nas demais áreas da cidade, sobretudo as mais populosas. Muitas dessas áreas são regiões densas, de menor renda e/ou de maior participação da população negra.

 

[para saber mais, clique aqui e veja o estudo completo]

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Qual é o Porte
dos Monumentos?

Quanto mais branca a obra, maior ela é (média de 3,4m). Quanto mais controversa a figura retratada, maiores as dimensões do monumento que a representa (média de 5,3m). Figuras negras e indígenas não apenas possuem muito menos obras na cidade como também são menores (2,2m e 2,8m): elas são 33% e 15% mais baixas, respectivamente.

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As diferenças são ainda maiores, quando comparadas às dimensões dos monumentos em homenagem a figuras controversas, os quais têm 5,3 metros de altura média: 2,4 vezes maior que a altura média de monumentos negros e 1,9 vez maior que a média de obras que homenageiam indígenas. As mulheres, por sua vez, além de sub-representadas por terem quase 9 vezes menos obras do que os homens, são retratadas por monumentos cuja altura média é de 1,8 metros, 43% mais baixos que as obras de figuras masculinas (média de 3,2 metros).

 

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que histórias
estão por trás
dos monumentos?

Os monumentos cumprem a função de introduzir, impor, reproduzir e modelar narrativas. Não existe monumento vazio de conteúdo ou de intenção: todos eles são construções sociais politicamente concebidas (Corrêa, 2005). Cada monumento erguido na cidade de São Paulo é, portanto, retrato de seu tempo e espelha os grupos sociais que o propuseram, transmitindo seus valores e suas perspectivas sobre a história.

Os períodos propostos a seguir não representam uma divisão historiográfica definitiva e buscam, tão somente, provocar debates e reflexões sobre as relações entre patrimônio, memória, cultura, diversidade e representatividade, através da história.

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Na formação, expansão e transformação de São Paulo, a elite paulistana se esforçou para construir referenciais simbólicos com base na figura dos bandeirantes e jesuítas para criar uma identidade em torno de um passado supostamente heroico e desbravador. Nesse contexto, foram erguidos muitos dos monumentos controversos, os quais, até hoje, têm as maiores médias de altura. Também desse período, datam os únicos monumentos de pessoas indígenas; todos em cenas que reproduzem o estereótipo perpetuado pelo homem branco.

Com o processo de retração econômica e com a ampliação de tensões e desigualdades, ocorre um esforço de recuperação dos símbolos nacionais e paulistas forjados no decorrer do século XX como tentativa de retomar a glória da cidade. Apesar dos monumentos erguidos nesse período serem de menores dimensões, eles ainda mantêm um tom majestoso e seguem homenageando figuras controversas.

Após a democratização do país, a organização dos movimentos de base e a mobilização da sociedade civil fizeram com que as disputas da/na cidade ganhassem novos contornos, fortalecendo certos debates. Paralelamente, a ocupação dos espaços de poder por grupos historicamente marginalizados favorece a reivindicação de que outras narrativas também ocupem o espaço público. Grande parte dos monumentos que homenageiam pessoas negras têm sido erguidos neste período – ainda em construção.

Que histórias as
cidades nos contam?

O debate sobre a representatividade das diversidades sociais no espaço público – o que inclui sua produção intelectual artística, cultural, religiosa, ancestral – é fundamental para entendermos que as vivências de grupos historicamente subalternizados são relevantes para o espaço urbano. Enunciar, valorizar e proteger sua memória é um dos elementos constitutivos para o exercício do direito à cidade. Para pensar e construir cidades justas, educadoras, antirracistas e sem discriminação, propomos uma pergunta como ponto de partida: que histórias as cidades nos contam? A seguir, abordamos o conjunto de monumentos oficiais do Município de São Paulo para tentar lançar respostas e provocações a partir dessa pergunta.

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cidades nos contam?

O debate sobre a representatividade das diversidades sociais no espaço público – o que inclui sua produção intelectual artística, cultural, religiosa, ancestral – é fundamental para entendermos que as vivências de grupos historicamente subalternizados são relevantes para o espaço urbano. Enunciar, valorizar e proteger sua memória é um dos elementos constitutivos para o exercício do direito à cidade. Para pensar e construir cidades justas, educadoras, antirracistas e sem discriminação, propomos uma pergunta como ponto de partida: que histórias as cidades nos contam? A seguir, abordamos o conjunto de monumentos oficiais do Município de São Paulo para tentar lançar respostas e provocações a partir dessa pergunta.

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O debate sobre a representatividade das diversidades sociais no espaço público – o que inclui sua produção intelectual artística, cultural, religiosa, ancestral – é fundamental para entendermos que as vivências de grupos historicamente subalternizados são relevantes para o espaço urbano. Enunciar, valorizar e proteger sua memória é um dos elementos constitutivos para o exercício do direito à cidade. Para pensar e construir cidades justas, educadoras, antirracistas e sem discriminação, propomos uma pergunta como ponto de partida: que histórias as cidades nos contam? A seguir, abordamos o conjunto de monumentos oficiais do Município de São Paulo para tentar lançar respostas e provocações a partir dessa pergunta.