enquanto a rua não for livre, eu também não sou • sobre a importância do carnaval de rua
Na última terça-feira (19), as escolas de samba receberam o diploma que oficializa o carnaval paulista como patrimônio imaterial do estado de SP. A decisão foi tomada em 2020, quando o Condephaat definiu, por unanimidade, que “as práticas carnavalescas traduzem saberes, fazeres e uma identidade coletiva que estabelece relações de pertencimento”.
A homenagem foi feita, no entanto, num momento de impasse; enquanto os desfiles das escolas de samba começam a partir do dia 21/4, os blocos de rua permanecem proibidos de festejar nos espaços públicos da cidade – vale ressaltar que reprovação se mantém num contexto no qual as festas particulares acontecem, a todo vapor, com a permissão da prefeitura.
Em virtude disso, associações de blocos carnavalescos publicaram, recentemente, um manifesto no qual reivindicam um carnaval de rua livre, diverso e democrático, assim como garante o direito constitucional. “Afinal, qual é o critério que permite aglomerações em espaços privados, mas reprime o encontro de foliões nos espaços públicos?”, indagam os blocos, tendo em vista que o carnaval é, por essência, uma festa popular e o esperado é que ela não se curve aos interesses que privilegiam o lucro, o individualismo e o consumismo.
Vale questionar, ainda, porque este importante reconhecimento do valor cultural das escolas de samba, feito pelo Condephaat, não se estende aos blocos que fazem o carnaval de rua e mantém a tradição secular de trazer os foliões às ruas para se divertirem, se expressarem, transformarem às duras as lógicas do cotidiano, ocupando inteiramente as ruas das cidades e subvertendo a lógica urbana que privilegia o automóvel e a privatização dos espaços públicos.
Como o próprio manifesto aponta, o carnaval é uma tradição histórica e antes mesmo de ser conhecido por este nome, as elites já tentavam o embranquecer e privatizar; mas quanto mais ele era repreendido, mais a sede por liberdade do povo crescia. Afinal, a festa permanece, ainda hoje, como uma das poucas manifestações nas quais temos o direito de ser livres durante o ano inteiro, transformando as ruas num lugar de permanência e não apenas de passagem.