notícias

Pandemia da Ponte pra Cá: confira a campanha do Juventudes nas Cidades

18/05/2021

Na última segunda-feira (17/05), o Largo da Memória – local histórico de resistência em São Paulo e um dos principais monumentos da cidade – foi cenário de um projetaço organizado por 37 coletivos que compõem a rede Juventudes nas Cidades, com o apoio da Ação Educativa e do Instituto Pólis, que juntos coordenam as atividades do projeto na capital paulista. 

Enquanto dezenas de trabalhadores voltavam para a casa, a empena localizada em cima do metrô Anhangabaú e próxima ao Terminal Bandeira foi estampada com pedidos para o uso de máscaras e vacinas e estatísticas que mostram quem são as pessoas mais afetadas pela pandemia – pretos e pobres. Foram mais de duas horas de projeção, feita em parceria com o Coletivo Coletores, organização que pensa a cidade como meio e suporte para suas ações, a partir de arte interativa e digital.

Em parceria com o coletivo Onilé, também foram distribuídos projetores de mão para integrantes do projeto, e que possibilitaram a projeção dos materiais em territórios periféricos da cidade, como São Mateus, Grajaú, Carrão, Sapopemba, Rio Pequeno, Butantã e Vila Tiradentes. 

As artes estão disponíveis para download aqui, e podem ser utilizadas nas redes sociais, projetaços, cartazes… Só não esqueça de registrar, e usar a #PandemiadaPontepraCá. 

Na subida do morro é diferente

Desde o início da pandemia, jovens das periferias da capital paulista têm relatado a carência de políticas públicas no combate à Covid-19 em seus territórios. A falta de recursos, protocolos de saúde ineficazes no contexto da periferia e as dificuldades de cuidar da saúde mental são os que causam mais preocupação.  

É possível ver que a pandemia não só piorou os problemas já conhecidos nos territórios periféricos, como os tornou mais complexos e trouxe novos obstáculos. Falta de saneamento e água, acesso restrito a equipamentos de proteção, como máscaras e álcool em gel, e interrupção de serviços sociais são apenas a ponta do iceberg.  

“Aqui em casa, às sete horas da noite cortam a água. Isso já dificulta a higiene pessoal, tão importante agora na pandemia”, diz Maya Guedes, integrante dos coletivos Transferência e Entre Vielas, ambos localizados no Grajaú, na Zona Sul da cidade. “E nem sempre produtos para a limpeza são opção. Às vezes também não temos condição de comprar sabonete, álcool em gel”, acrescenta.  

Em relação ao uso de máscaras, preço e desinformação atrapalham o esforço de proteger a população. “A gente tem enfrentado muitas fake news com relação às informações da pandemia. Já vi pessoas dizendo que não confiam na vacina.”, exemplifica Thaís Oliversi, do Coletivo Periferia Preta, atuante no distrito de Sapopemba, Zona Leste de São Paulo.  

Para Mayana Vieira, do coletivo Slam do Grajaú, na região Sul, nem todos os protocolos de saúde funcionam para a população da periferia, principalmente trabalhadores. “O distanciamento social é quase impraticável. Quem continua saindo para trabalhar tem que enfrentar trens e ônibus lotados, no Terminal Grajaú em horário de pico, por exemplo, é impossível manter um distanciamento de 2 centímetros por pessoa, quiçá 2 metros”, afirma.  

Essas e outras discussões foram compartilhadas na live “Na Subida do Morro é Diferente: Realidades das Juventudes em Pandemia”, com a presença da covereadora Carolina Iara, e  integrantes de coletives das quatro capitais em que o Juventudes nas Cidades atua:  Jarda Araújo (PE), Rayssa Pereyra (RJ), Ruan Guajá  (DF) e Thais Oliversi (SP). A mediação foi de Jahpam (SP).  O papo teve como tema a realidade das juventudes durante a pandemia do coronavírus, e aconteceu simultaneamente ao projetaço.  Assista na íntegra no link abaixo:


Acesso à internet

O desafio de adequar as atividades para o online é outra das questões que dificultam a manutenção de protocolos nesses territórios. “Acesso à internet ainda é algo limitado em algumas periferias. Então como mantemos crianças estudando? Como trabalhamos de casa? Como consumimos cultura e divulgamos nossos trabalhos sendo que o online é limitante e o trabalho de rua se tornou um risco?”, questiona Pamella de Mendonça, conhecida como Jahpam, do coletivo Reggae Action, da Zona Leste de São Paulo.  

Continuar as ações afirmativas em seus territórios não é um desafio apenas do coletivo da Pamella. De acordo com Raquel Luanda, que integra a equipe de coordenação do programa Juventude nas Cidades na capital paulista, o trabalho de coletivos que atuam na periferia é muito pautado na abordagem de rua para divulgar suas produções e ativismo. Uma vez que a rua não é mais uma opção, muitos trabalhos foram quase paralisados.  

“Desde o começo da pandemia o maior desafio é pensar em como dar conta de levar transformações e reflexão para os jovens e coletivos que trabalhamos que, muitas vezes, não têm acesso à internet para ver nossa agenda, nossas produções. Tanto sobre questões culturais, como também informações de saúde, serviços e ajuda humanitária. As políticas públicas atuais não consideram essas realidades e praticamente abandonam uma parte da população”, diz Raquel, que lembra que muitos coletivos migraram para trabalhos humanitários ao invés de dar continuidade às suas ações.  

A partir deste panorama, o programa Juventude nas Cidades disponibilizou chips com 20GB de internet para os jovens que participam do projeto. Além de assegurar a presença deles nas ações, ajudou a despertar a reflexão sobre direitos digitais.

Saúde mental

Todos esses obstáculos também serviram para impactar na saúde da população das periferias. Com o controle da pandemia prejudicado, a taxa de infecções nesses territórios só cresce. Isso, segundo os jovens ouvidos, impediu que muitas pessoas buscassem atendimento médico por medo da Covid-19. A saúde mental também foi afetada.

“Como eu vou ter concentração para escrever um texto para um edital se a vida está desse jeito? Se eu não estou conseguindo pagar o meu aluguel? Às vezes, eu tenho o mínimo, mas quem está andando comigo não.”, relata Esther Rodrigues De Oliveira, do coletivo Mulekalê.  

O Juventude nas Cidades, em parceria com o Instituto AMMA Psique e Negritude – organização não governamental de enfrentamento ao racismo, formado por um grupo de psicólogas – ofereceu tratamento no qual os jovens puderam refletir sobre os primeiros impactos da pandemia em suas vidas.

Juventude nas Cidades: ações

Entre os dias 14 e 15 de maio, a Oxfam Brasil, em parceria com as instituições que coordenam o programa Juventudes na Cidade no Brasil, promoveu o 1º Festival Juventudes nas Cidades. O evento foi inteiramente online, e contou com 24 atrações de arte e cultura organizadas por coletivos de jovens de São Paulo, Recife, Rio de Janeiro e Distrito Federal.

Mesmo com os obstáculos impostos pela pandemia, os jovens participantes do programa Juventude nas Cidades também desenvolveram uma série de ações voltadas para formação e com foco nos coletivos culturais, no último ano. São elas:

  • Cartilha para inscrição de projetos em editais públicos – O documento foi criado a partir de oficina colaborativa que incentivou os jovens a pensarem na sustentabilidade dos coletivos culturais periféricos. Acesse aqui.
  • Ações integradas sobre a cultura de segurança para defensores de direitos humanos – A atividade envolveu encontros e um episódio do podcast Rádio Juv, sobre vigilância, privacidade e segurança. Também foi produzido um painel que ilustra as motivações dos coletivos e o que fazer para garantir a proteção física e digital dos ativistas.

              Veja o painel aqui e confira o podcast abaixo:

  • Carta manifesto – O documento foi destinado a candidatos(as) a vereadores(as) nas eleições municipais de São Paulo de 2020. Elaborado a partir de encontros quinzenais que incentivaram troca de saberes e debates de pautas prioritárias aos jovens, requisitou direitos à empregabilidade, renda e suas intersecções nas dimensões de raça, orientação e identidade de gênero, dentre outras. O manifesto completo está disponível aqui.

 O Juventude nas Cidades é uma iniciativa nacional das organizações Oxfam Brasil, Ação Educativa, ONG Fase, IBASE, INESC e Criola.