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PLANO DIRETOR ESTRATÉGICO – Membro da União por Moradia Popular comenta o texto substituto do PDE
02/04/2014No dia 26 de março, o vereador Nabil Bonduki, relator da proposta de substitutivo do Plano Diretor Estratégico, apresentou o texto durante reunião da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente.
Leia o texto da proposta de substitutivo do Plano Diretor Estratégico.
Agora, uma série de audiências públicas e temáticas acontecem, com o intuito de debater o substitutivo. O Instituto Pólis conversou no dia 2 de abril com a militante da UMM (União Nacional por Moradia Popular), Evaniza Rodrigues, para saber como o movimento por moradia vê o novo texto do Plano Diretor Estratégico.
Leia a entrevista na íntegra abaixo.
Instituto Pólis – Como vocês enxergam o texto substitutivo do Plano Diretor?
Evaniza Rodrigues – Claro que pra União, o Plano Diretor é um tema mais caro e que mais mobiliza dentro das bases do movimento porque é um tema que diz respeito diretamente à nossa ação cotidiana. E principalmente porque as pessoas conseguem olhar e buscar completamente os espaços que elas querem atuar. E que espaços elas vem perdendo na cidade para sustentar o sistema imobiliário. A partir de 2002, a gente viu empresas que constroem para classe média baixa atuar em bairros que sempre foram bairros populares – regiões como São Mateus, Sapopemba, Brasilândia. E isso impacta diretamente em conseguirmos ou não moradia nesses lugares. São áreas consolidadas pela periferia que hoje estão sendo apropriadas pela classe média.
– Por causa do Minha Casa, Minha Vida?
Por causa da disponibilidade de financiamento imobiliário do Minha Casa, Minha Vida e do próprio mercado. Então a gente foi sendo empurrado. Nós investimos muito para identificar a região em que atuamos, que vai do centro da cidade a bairros consolidados e a periferia, para pensar em propostas de lei para toda a cidade. Isso foi o que apresentamos ainda na primeira etapa do PDE na Secretaria de Desenvolvimento Urbano, um pacote de 400 áreas que a gente vem acompanhando desde então. Parte dessas áreas entrou no PL no executivo, parte não entrou. E a gente viu que o produto que o executivo trouxe quantitativamente ainda não era satisfatório. Aí entra a questão da localização dessas Zeis. De fato, a gente percebe que conseguimos uma indicação bastante interessante na zona central, mas ainda estamos com dificuldade nessa zona intermediária consolidada. Estou falando de Vila Matilde, Freguesia do Ó, Lapa, Butantã… Desse anel que é urbanizado e que até pouco tempo atrás era periferia, mas que hoje já não é mais.
A outra coisa importante em relação às Zeis, é que elas sejam prioritariamente para baixa renda. Olhando para elas, a gente percebe que o mercado não vai se interessar. Então, aliada a essa política, tem que ter uma política fundiária municipal, de aquisição, de apropriação de terrenos.
É muito pouca a nossa capacidade de conseguir negociar essas terras no mercado. Mesmo programa Minha Casa, Minha Vida tendo essa possibilidade, a gente conseguiu terrenos sem ajuda, todos os terrenos do “Minha Casa Minha Vida” fomos nós que negociamos, porque a prefeitura não ajudou em nada. Só que a gente sabe que a nossa capacidade é limitada porque estamos concorrendo diretamente com as construtoras. Então, por que eles vão vender um terreno pra mim e não vão vender pra MRV? Nós estamos disputando os mesmos espaços. Então, a gente acha que essa estratégia das Zeis 2 e 3, mais focada na HIS é fundamental é fundamental, mas tem que ser acompanhada por uma política municipal fundiária, com recursos alocados para isso.
– O que você achou da Cota de Solidariedade, que cria condições para que sejam definidos mecanismos de contrapartida para o licenciamento de grandes empreendimentos imobiliários, que visam a função social da propriedade, vinculando 30% dos recursos do FUNDURB para a compra de terra para habitação popular?
Para o município ter uma política fundiária é necessário ter recursos, que podem ser terra ou em recurso mesmo. Na Cota de Solidariedade nós fizemos a opção de que as cotas sejam somente em terra. Nós não queremos em recursos. Porque senão voltamos para a especulação do mercado imobiliário, de novo a prefeitura vai sair comprando áreas valorizadas pelo próprio empreendimento que está sendo construído. Então, para nós hoje, terra vale mais do que dinheiro.
– E isso foi contemplado pelo novo texto?
Isso foi contemplado porque na Cota de Solidariedade as únicas possibilidades são aporte em terra ou em unidades habitacionais. Não foi aceito, como queriam alguns, a possibilidade de ser feito em dinheiro. Porque para isso já existe a outorga onerosa. E, por outro lado, os recursos do FUNDURB para os demais instrumentos –que não a Cota- devem ser repassados para a aquisição de terrenos. É uma terceira estratégia. Porque a Cota tem um corte, ela não vai atingir todos os empreendimentos da cidade, tem um padrão. Para esses outros empreendimentos esses existem outros instrumentos, um deles é a outorga onerosa. O que nós queremos é que desses demais instrumentos que venham para o FUNDURB parte seja destinada para que a Prefeitura possa fazer a aquisição de terras. Por que isso é importante? Porque alguns lugares da cidade vão começar a ser desenvolvidos, vão começar a ter um impacto pelas ações que o próprio plano está definindo, por exemplo, a questão dos eixos, as obras de mobilidade, então, se a prefeitura não tiver mecanismos para que ela possa chegar nesses lugares e adquirir os imóveis previamente, a gente vai perder essa oportunidade. Então, são instrumentos que se complementam para dar conta de atuar no território como um todo.
– O que vocês esperam das próximas audiências públicas sobre o Plano Diretor?
A gente entende que o substitutivo avança em bastante aspectos, o que nós não queremos ter é recuos das negociações. E acho que esse momento das audiências públicas, dessa última etapa antes da aprovação definitiva do plano, o importante é a gente reforçar quais são os pontos que para nós são inegociáveis. Então os movimentos vão se mobilizar para estar nas audiências públicas, mas nos também vamos nos mobilizar para estar na Câmara de Vereadores, pressionando, com alguns pontos que para nós são inegociáveis, que são a Cota de Solidariedade, para baixa renda, e que é uma quantidade de vez ZEIS que passa a frente à necessidade real de educação habitação, porque não adiantar ter ZEIS e não ter quantidade, porque se elas são em pouca quantidade, os proprietários deixam esses terrenos dormindo, como aconteceu no ano passado. E também é importante ter claras as sanções, que deixar essas áreas sem uso gere sanções, que a prefeitura tenha voz ativa nessa situação. Porque por exemplo na região do Brás, que tinha um monte de ZEIS demarcadas, e o pessoal falou ‘se não posso fazer uma obra de alto padrão, não faço nada”. E deixou as áreas lá dormindo por dez anos, e nada aconteceu com esses proprietários.
– E depois das audiências o que vem?
A prefeitura tem que ser ativa na implementação do plano. Esse é o próximo capítulo, após a aprovação. É importante ter instrumentos de gestão democrática e controle social, para que a prefeitura efetivamente implemente o plano. O terreno que nós adquirimos em ZEIS, na zona leste era uma ZEI em 2002, nós adquirimos esse terreno em 2010. Durante estes oito anos que vigeu o plano diretor antes que nós comprássemos e déssemos uma função social para o terreno, o terreno não recebeu IPTU. Não é nem progressivo, é IPTU nenhum! Ele simplesmente não estava cadastrado no sistema de finanças do município e, portanto, o proprietário pagava INCRA num terreno ZEIS, em área urbana, na cidade de São Paulo. Então, a prefeitura simplesmente se absteve de exercer o que ela é obrigada a fazer. Ela tinha que cadastrar, ela tinha que lançar IPTU e ela tinha que cobrar. Ou seja, todos esses instrumentos dependem de uma postura ativa do Poder Público e de controle social. Então, alguns instrumentos de controle social a gente está aprofundando e uma novidade é ter comitês gestores de ZEIS, também de vazios, que não são utilizados. A gente quer deixar bastante claro no PL que tem que ter comitê gestor que acompanhe o que está acontecendo com essas áreas. Porque hoje nós nem conseguimos ter uma avaliação precisa do que aconteceu com as ZEIS de 2002.
– O vereador Nabil Bonduki diz que está prevista a criação de 400 mil unidades de habitação de interesse social. O que você acha desse número?
Esse é um número que ele está trabalhando com base na estatística tanto da Fundação João Pinheiro, aplicada ao Censo, como também pelo discurso que a prefeitura fez. Nós achamos que tem que ter um Censo Habitacional na cidade de São Paulo. Porque, de fato, até o conceito do que é déficit a gente ainda precisa rever. Hoje, a gente utiliza esse número porque é o melhor que nós temos. Não temos condições de dizer se há mais ou menos déficit. Agora, nós temos na cidade de São Paulo algumas características importantes, como o aumento de pessoas sozinhas –não tem política habitacional para essas pessoas-, as pessoas que passam pela cidade por um certo tempo, por exemplo estudantes ou mesmo trabalhadores que têm residências em outros lugares, uma demanda de população de rua que cada vez cresce mais, que não tem muito a ver com a relação trabalho-moradia, portanto, não é só uma ação de habitação, precisa de uma ação combinada com políticas sociais. Então, o déficit habitacional não é só um número, ele é uma complexidade de questões. Eu acho que São Paulo tem essa obrigação de fazer esse Censo Habitacional até para dar conta dessa realidade que, em muitos casos, tem diferenças de outras regiões do Brasil. Porque, por exemplo, você tem uma situação que são as famílias que ganham, no caso do Minha Casa, Minha Vida, uma renda de até R$ 1.600. Porém, quem ganha acima desse valor, e menos de R$ 3-3,5 mil, não tem alternativa. Porque não existe política pública para isso e o mercado não produz para essa demanda. Então, são situações que precisam de respostas específicas.
– Tem algum ponto crítico do Plano Diretor que você não concorda?
Eu acho que o ponto mais controverso é o da outorga onerosa. E, também, o formato das operações urbanas. Ainda há muita dúvida se esses formatos, de fato, atendem ao desenvolvimento da região, se eles servirão ao coletivo, sem causar impacto negativo para os moradores. Ontem, fizemos uma reunião sobre a Operação Urbana Águas Espraiadas, onde estão ‘sobrando’ 1.500 famílias, embora tenha previsão de atendimento de 8.500 famílias. Acho que é possível fazer operação urbana sem exclusão, só que isso, até hoje, não aconteceu.